A irradiância global é composta pela soma das irradiâncias direta e difusa. A irradiância direta é a parcela da irradiância do sol que atinge a superfície sem desvios, enquanto a irradiância difusa é a parcela da irradiância do sol que sofre espalhamento por nuvens, moléculas de ar e aerossóis na atmosfera.
Em dias nublados, a irradiância pode exceder o valor esperado de irradiância de céu claro. Esse fenômeno é chamado de sobreirradiância, e pode ocorrer devido a três principais motivos: i) aumento da irradiância por nuvens próximas ao disco solar; ii) é possível que sob nuvens homogêneas a irradiância difusa seja grande antes e depois do evento de sobreirradiância, de modo que as bordas de nuvens não contribuam muito para o aumento da irradiância; e, iii) o sol seja parcialmente obscurecido por uma fina camada de nuvens de modo que a irradiância difusa possa obter valores muito altos enquanto a irradiância direta tem valores relativamente baixos (GUEYMARD, 2017).
As características elétricas dos módulos fotovoltaicos (FV) são definidas sob condições padrões de teste (Standard Test Condition – STC), ou seja, com uma irradiância de 1000 W/m² incidente no módulo e uma temperatura de operação de 25 °C. Essas condições são raras durante o funcionamento dos sistemas fotovoltaicos.
Na prática, a irradiância solar e a temperatura são variáveis de acordo com as condições climáticas, e conforme elas variam, as características de um módulo fotovoltaico também variam, conforme mostrado na Figura 1 para o módulo MSX-60 fabricado pela Solarex (MOREIRA, 2018). No caso, a corrente do módulo fotovoltaico é quase que diretamente proporcional a irradiância, já a tensão é relacionada a temperatura.

Figura 1. Curvas I-V e P-V geradas para diferentes valores de irradiância e temperatura (MOREIRA, 2018).
Os valores de irradiância podem exceder consideravelmente o valor de 1000 W/m² devido ao fenômeno de sobreirradiância (ou cloud enhancement). Valores de irradiância de 1477 W/m² foram registrados em Recife-PE (PIACENTINI et al., 2011), 1551 W/m² em Irecê-BA (BRAGA et al., 2018), 1650 W/m² em Água Branca-AL (DE ANDRADE; TIBA, 2016), entre outras.
A ocorrência desses fenômenos extremos tem impacto na geração fotovoltaica, uma vez que os parâmetros elétricos dos módulos fotovoltaicos são apresentados para irradiância na ordem de 1000 W/m². Condições de sobreirradiância podem fazer com que a potência máxima dos módulos FV exceda a potência máxima DC do inversor conectado aos módulos. Quando isso ocorre, o inversor opera no modo de limitação de energia, movendo o ponto de operação para tensões mais elevadas do que as do ponto de máxima potência dos módulos FV, reduzindo, portanto, a corrente e a potência. Assim, resultando em clipping.
A operação no modo limitação de energia afeta negativamente o inversor pelos seguintes motivos: i) a eficiência de alguns inversores reduz com o aumento da tensão no lado CC, causando mais perdas no lado CA; ii) a vida útil do capacitor do inversor diminui com o aumento da tensão CC; e, iii) em condições extremas a tensão necessária para limitação de energia pode estar fora do range de tensão permitido pelo inversor.
Além disso, como os valores elevados de irradiância causam um aumento da corrente acima dos valores de STC, os cabos devem ser dimensionados para suportar essas correntes elevadas. Por esse motivo, a norma IEC 60364-7-712 indica que o cabo da string deve ser capaz de suportar no mínimo 1,25 vezes a corrente de curto-circuito do módulo fotovoltaico na temperatura de 80 °C.
A NBR 16690 define a capacidade mínima de corrente dos circuitos de acordo com a tabela a seguir, e menciona ainda que a corrente de curto-circuito dos módulos FV costuma ser diferente nas primeiras semanas ou meses de operação dos módulos, o dimensionamento do condutor deve considerar o maior valor. A Iscmod inicial deve ser obtida junto ao fabricante.

Figura 2. NBR 16690.

Figura 3. NBR 16690 .
Referências
BRAGA, M. et al. AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DE DIFERENTES TECNOLOGIAS FOTOVOLTAICAS EM IRECÊ, BA. VII Congresso Brasileiro de Energia Solar. Anais...2018. Disponível em: <www.fotovoltaica.ufsc.br>
DE ANDRADE, R. C.; TIBA, C. Extreme global solar irradiance due to cloud enhancement in northeastern BrazilRenewable Energy, Elsevier Ltd, 1 fev. 2016.
GUEYMARD, C. A. Cloud and albedo enhancement impacts on solar irradiance using high-frequency measurements from thermopile and photodiode radiometers. Part 1: Impacts on global horizontal irradiance. Solar Energy, V. 153, 1 Set. 2017, Pages 755-765.
JARVELA, M.; LAPPALAINEN, K.; VALKEALAHTI, S. Characteristics of the cloud enhancement phenomenon and PV power plants. Solar Energy, 2020.
MOREIRA, H. S. Estudo de Técnicas de Rastreamento de Máxima Potência Tolerantes a Sombras para Sistemas Fotovoltaicos. [s.l: s.n.].
PIACENTINI, R. D. et al. Extreme total solar irradiance due to cloud enhancement at sea level of the NE Atlantic coast of Brazil. Renewable Energy, v. 36, n. 1, p. 409–412, jan. 2011.
Autora: Karen Barbosa de Melo

Karen Barbosa de Melo é Engenheira Eletricista na Alexandria Solar, Professora nos cursos do ProfJL e fundadora da KBM Energia. Doutoranda em Engenharia Elétrica na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), onde desenvolve pesquisa sobre métodos de cálculo da posição do sol aplicados a seguidores solares. Mestre em Engenharia Elétrica pela UNICAMP. Possui graduação em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e Técnico em Eletrotécnica pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas (IFAM).
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